quarta-feira, novembro 16

Se tem uma coisa que me enche o saco é gente que tem uma atitude no discurso e outra na prática. Que fala demais e faz de menos. Que diz que pensa assim, mas age assado.
Eu sou daquelas pessoas que defende ferozmente o direito do outro ter sua opinião, sua crença, seu modo de ser e fazer. Ainda que seja diferente do meu. Eu acho que cada um sabe o que é melhor para si e deve ter o direito de decidir qual caminho lhe cabe ou não.
O que eu não aguento é hipocrisia. Dizer que acredita em x mas arranjar um jeitinho de acabar fazendo y. Ter um lindo discurso ressaltando as qualidades e vantagens do caminho a, mas na hora da verdade optar mesmo pelo caminho b. Que, aliás, quase sempre é o mais fácil, mais provável e mais previsível.

Desde que as meninas nasceram de parto normal, o que tem de grávida que me procura dizendo que quer um PN e precisa de ajuda para conseguir não está escrito.
A questão é que pouquíssimas querem de verdade. O que chega aqui é aquele discurso velho conhecido de quem anda falando, pensando ou pesquisando sobre parto por aí: 'ai, eu seeeempre sonhei em ter PN', ou 'não consigo me imaginar fazendo uma cesárea sem um motivo claro para isso'. Mas o que tem por baixo do pano é muito diferente. O discurso certo seria algo como: 'olha, eu tenho uma vaaaga preferência por parto normal, mas nem vou pensar muito nisso. Ora, na hora o médico decide!'. Se o discurso fosse sincero e coerente com o que a pessoa efetivamente quer e pensa, eu pelo menos saberia o que esperar. E quanto de energia dispender para ajudar.
Aliás, que fique claro: eu NÃO acho que toda mulher deva fazer parto normal. Eu sou por demais partidária da liberdade para defender uma idéia como essa.
Se uma grávida me chegar agora e disser que já pensou bastante a respeito e decidiu que quer fazer cesárea, ótimo. Podem ter certeza que eu não vou nem me pronunciar a respeito. Vou 'enfiar a viola no saco' e sair de fininho. Porque o que eu acho mais importante em qualquer processo na vida é isso: escolha informada. Pesquisar, aprender a respeito, refletir e, finalmente, decidir o que é melhor para si. Porque cada um é um, mesmo. E o que é bom para mim pode não ser para o outro.
Agora, o que eu não aguento é esse discursinho hipócrita de que quer parto normal, que sabe que é melhor para a mãe e para o bebê, que leu a respeito e sabe perfeitamente o que aceitar ou não do médico, etc. e, na hora H, dizer que fez (ou vai fazer) cesárea porque o bebê está grande demais, porque o cordão está enrolado, porque a bacia é estreita, porque tem uma unha encravada, uma espinha do lado direito do rosto ou o cabelo tingido de acaju e isso pode ser perigosíssimo para o bebê.
Eu fico aqui matutando: essas pessoas são excessivamente crédulas e ingênuas e acreditam mesmo nesses argumentos ou estão apenas querendo se justificar para os outros??
Se for a primeira opção, eu posso até passar batido. Ingenuidade é coisa que a gente só aprende a superar com o tempo, mesmo. E tempo, cada um tem o seu. Nisso eu não me meto.
Agora, se for a segunda opção, aí comigo não tem jeito. A coisa degringola de vez. Eu fico pê da vida e acabo, como é um hábito meu (do qual eu não me orgulho e que pretendo melhorar um dia, mas não hoje...), dizendo 'na lata' tudo o que penso a respeito. E a pessoa acaba ouvindo o que quer e o que não quer.
É que eu acho que seria mais corajoso e mais adulto que essas pessoas tivessem a coragem de dar a cara para bater e assumir a própria opção. Que disessem somente que vão fazer cesárea porque a barriga está pesada, porque o desconforto é demais, porque estão ansiosas para ver a carinha do bebê. Ou que dissessem somente: 'vou fazer cesárea porque decidi assim'. E pronto. Sem explicação nem nada. Afinal, a vida é delas mesmo. Elas devem explicação a quem?

Sei que estou sendo rude, radical, intransigente e mais uma série de adjetivos que certamente vão pipocar nos comentários.
É que eu estou cansada. Para cada pessoa que vem procurar minha ajuda, eu não disponho apenas uma série de palavras digitadas com displicência no teclado do computador. Eu me mobilizo, busco as infomações que a pessoa me pede, dou atenção sempre que solicitada, coloco também o meu coração junto da pessoa. Porque é assim que eu sou.
Talvez o erro esteja aí. Talvez a errada seja eu. Talvez eu esteja me doando demais. Talvez.
Mas eu vou continuar. Sei que ainda vou dar com a cara na parede umas tantas vezes.
É que mesmo assim eu ainda acho que vale a pena.
Se uma, uma grávida só conseguir ter seu (verdadeiramente) sonhado parto normal, indo contra todas as probabilidades e estatísticas, eu já vou ficar numa alegria de dar gosto.
Vai entender.
Às vezes, ser bicho sonhador dá um trabalho danado...


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